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quarta-feira, 25 de maio de 2011

Artigo de Mãe Stella de Oxóssi: 25 de maio: bênção, Mamãe África

Maria Stella de Azevedo Santos
Maria Stella de Azevedo Santos*
Iyalorixá do Ilê Axé Opô Afonjá
opo@gmail.com

Ainda de pouco conhecimento da sociedade é o fato de hoje, 25 de maio, se comemorar o Dia da África. Data escolhida porque em 1963 a Organização de Unidade Africana, hoje com o nome de União Africana, foi fundada com o objetivo de ser, internacionalmente, a voz dos africanos. Hoje, o Terreiro Ilê Axé Opô Afonjá está recebendo uma média de cinquenta professores da rede municipal, juntamente com o seu secretário, para conosco comemorar este dia, que se constitui em uma tentativa de que os olhos e os corações do mundo se preocupem e se ocupem de cuidar do povo desse continente, mas também de aprender e apreender sua sabedoria, que, como neta de africana e iniciada em uma religião que tem em África sua matriz, foi a mim transmitida. Oportunidade que tudo faço para não desperdiçar.

Muitas sementes da sabedoria dos africanos, em mim plantadas, ainda não encontraram terreno fértil para germinar, mas não desisto e, por isso, cuido desse terreno em todo momento. Outras há, no entanto, que cresceram e até deram frutos. Foi assim refletindo que resolvi homenagear o berço da humanidade – a África -, aproveitando este precioso espaço de comunicação que a mim foi concedido para, humildemente, tentar espalhar essas sementes, na esperança que elas caiam em terrenos férteis.

Foi através da tradição oral, chamada na língua yorubá de ipitan, que entrei em contato com a maravilhosa arte de viver do africano, que tem na alegria um de seus fundamentos. Entretanto, nós brasileiros, que temos nesse povo uma de nossas descendências, não devemos correr o risco de sermos megalomaníacos e considerar a filosofia africana a melhor. Todo povo possui sua sabedoria, mas a Sabedoria, assim como Deus, é uma só. A mesma base, os mesmo fundamentos, apenas transmitidos de acordo com a cultura e o lugar de viver correspondente. Se foi através da tradição oral que aprendi, é agora na escrita, iwe-kikó, que encontro condições favoráveis para transmitir, a um maior número de pessoas, os ensinamentos absorvidos e os quais ainda pretendo assimilar, de maneira profunda.
Conheçamos, então, um pouco do muito que possui a filosofia do povo africano:

- É na alegria e na generosidade que se encontra a força que se precisa para enfrentar os obstáculos da vida: “Lé tutu lé tutu bó wá” = “Sigamos em frente alegremente, sigamos em frente iluminados, dividindo o alimento adquirido”.

- A palavra tem o poder de materializar o que existe em potencial no universo, por isso os africanos falam muito e alto, quando precisam canalizar sua energia em direção ao que é essencial, mas silenciam nas horas necessárias. Um orin faz entoar: “Tè rolè... Mã dé tè rolè. Báde tè role” = “Eu venero através do silêncio... Eu pretendo cobrir meus olhos e calar-me. Ser conveniente, respeitando através do silêncio”.

- Nosso maior inimigo (como também nosso maior amigo) somo nós mesmos: “Dáààbòbò mi ti arami” = “Proteja-me de mim mesma”.

- O cuidado com o julgamento do outro e também com o instinto de peversidade: “Bí o ba ri o s'ikà bi o ba esè ta ìká wà di méjì” = “Se vir o corpo de um perverso e chutá-lo, serão dois os perversos”.

- O respeito às diferenças: “Iká kò dógbà” = “Os dedos não são iguais”.

- A necessidade de um permanente contato com a Essência Divina que cada um possui: “Eti èmí óré dé ìyàn. Àroyé èmí óré dé ìyà” = “Na dificuldade de decisão e no debate, a Essência Divina amplia a visão para argumentar”.

Como se vê, o corpo da tradição oral africana, que é composto de itan – mito; oriki – parte do mito que é recitada em forma de louvação e vocação; orin – cântico de louvação; adurá – reza; ówe – provérbio serve para nos disciplinar. Entretanto, nenhuma sabedoria tem mais valor do que a filosofia do ìwà, palavra que pode ser traduzida como conduta, natureza, enfim, caráter. Devemos estar atentos aos nossos comportamentos. Pois, como falam os africanos após enterrar um amigo, “ó kù ó, ó kù ó ìwà ré”, querendo dizer, “não podemos lhe acompanhar no resto de sua viagem, agora só fica você e seus comportamentos”.

* Artigo publicado na editoria Opinião do Jornal A Tarde, no dia 25/05/2011

terça-feira, 24 de maio de 2011

Terreiros são bens para serem tombados ou registrados?

Evento do IPAC com entrada franca no Conselho de Cultura da Bahia acontece no Dia Mundial da África (25.05) instituído pela Organização das Nações Unidas (ONU) desde 1972

Roça do Ventura recentemente tombada pelo IPHAN
Os terreiros de candomblé na Bahia são patrimônios materiais ou imateriais? Eles devem ser tombados – salvaguarda para bens tangíveis – ou registrados – para bens intangíveis? A importância deles está nas suas edificações ou nos símbolos e signos culturais desses espaços sagrados de matriz africana? Essas e outras perguntas servirão de base para o próximo encontro do “Conversando sobre Patrimônio”, projeto do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural (IPAC), que convida especialistas para discutir importantes temas sobre bens culturais baianos.

Com a temática da "Salvaguarda do Patrimônio Cultural Afro-brasileiro", o encontro acontece nesta quarta-feira, 25 de maio (2011), às 14h no Conselho Estadual de Cultura (Palácio da Aclamação, Av. 7 de Setembro, 1330, Campo Grande/Forte de São Pedro). A entrada é franca e a reunião ocorre para marcar o “Dia Mundial da África” instituído pela Organização das Nações Unidas (ONU) desde 1972

“O reconhecimento oficial da importância da tradição afro-brasileira pelos poderes públicos constituídos é muito recente, já que somente em 1984 o governo federal tombou pela primeira vez na história do Brasil um espaço sagrado de matriz africana”, ressalta o diretor geral do IPAC, Frederico Mendonça.

Um dos maiores expoentes da antropologia brasileira, o professor doutor do Museu Nacional (UFRJ), Gilberto Velho, foi relator do tombamento pelo Iphan/MinC do terreiro de candomblé Casa Branca, em Salvador. Há mais de vinte anos atrás a decisão já foi muito polêmica. “O Iphan geralmente tomba apenas terreiros considerados matrizes, como a Casa Branca, o Bate Folha, o Alaketu, entre outros, e precisamos estudar mais profundamente essas proteções do poder público”, diz Mendonça.

A salvaguarda oficial permite prioridade, do bem tombado ou registrado, nas linhas de apoio financeiro municipais, estaduais, federais ou até internacionais. A dúvida é que existem ou podem ser criados, via decretos estaduais, outras propostas de proteção. No IPAC já existem o tombamento, o registro para manifestações culturais tradicionais, como algumas festas populares, e o registro de lugar, que não tomba o espaço, mas o considera relevante oficialmente. Já em outros estados existem as Áreas de Proteção do Ambiente Cultural (Apacs), como no Rio de Janeiro, utilizadas pela prefeitura para proteger certos bairros ou regiões "descaracterizadas".

Os palestrantes serão os professores doutores da Universidade Federal da Bahia (Ufba), Fábio Velame e Márcia Santa'anna. Fábio é doutor em Conservação e Restauro, com ênfase em patrimônios imateriais, manifestações culturais e suas relações com arquitetura e cidade, atuando principalmente nos territórios tradicionais e arquitetura étnico-africana e afro-brasileiras, habitação escrava, quilombos, terreiros de candomblé e afoxés, entre outros. Já Márcia é mestre em Conservação e Restauro, doutora em Urbanismo e ex-diretora do Departamento do Patrimônio Imaterial do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
 

O IPAC é responsável pela política pública de preservação e difusão dos bens culturais baianos. As palestras são abertas ao público. Mais informações via telefones 3117-6491 e 3117-6492, ou endereço eletrônico astec.ipac@gmail.com.
 
 
Confira no Flickr as fotos no link abaixo:
http://www.flickr.com/photos/organize/?start_tab=sets
Crédito obrigatório: Lei nº 9610/98

 


Assessoria de Comunicação IPAC - em 22.05.2011 - Jornalista responsável Geraldo Moniz (drt-ba 1498) - (71) 8731-2641.              Contatos: (71) 3117-6490, ascom.ipac@ipac.ba.gov.br - www.ipac.ba.gov.br - Facebook: Ipacba Patrimônio - Twitter: @ipac_ba
 

domingo, 1 de maio de 2011

Biblioteca Abdias Nascimento

A Biblioteca Abdias do Nascimento foi inaugurada no dia 30 de maio de 2008, no bairro de Escada, subúrbio ferroviário de Salvador – Ba, sendo a primeira biblioteca comunitária especializada em cultura afro-brasileira e africana do estado. Trata-se de uma iniciativa de educadores, militantes e artistas oriundos de diversos seguimentos, preocupados com o alto grau de preconceito e exclusão social vivenciado pelos moradores dessa região que são de maioria negra e tem na cultura e religiosidade afro o seu principal diferencial.

O projeto contou, para a sua criação, com o patrocínio do Banco do Nordeste e do Governo Federal através do Programa BNB de Cultura 2008.

Este projeto visa incentivar a leitura e a valorização da auto-estima entre os moradores das regiões menos favorecidas, de população majoritariamente negra, ao proporcionar o acesso aos livros produzidos por autores negros ou voltados para esta temática, servindo ainda de instrumento no apoio para a implementação da Lei 10.639/03, atual lei 11.645/08 (que estabelece o ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana nas escolas). Com isso, pretendeu-se possibilitar às comunidades desta região o acesso a estas fontes de cultura e informação através da literatura, gerando uma visão crítica do mundo, valorizando a potencialidade destes indivíduos, criando referências, despertando o interesse pela leitura e escrita, colaborando para a formação de cidadãos conscientes e estimulados a lutar pela melhoria das suas condições de vida.

O projeto vem sendo apoiado por diversos seguimentos da sociedade que tem colaborado por meio de doações diversas para o acervo. Podemos citar como exemplo, o apoio recebido de instituições como a Petrobrás, Edições Maianga, Fundação Cultural Palmares, Portfolium, dentre outras, por meio de doação de materiais de livros, periódicos e material informativo. A biblioteca tem recebido a visita de um número cada vez maior de pessoas, entre estudantes, pesquisadores, educadores, artistas, lideranças religiosas, ONG's e membros da comunidade em geral, não se limitando apenas aos moradores do subúrbio ferroviário.

O acesso ao acervo é livre, sendo realizado de segunda à quinta-feira, das 9 às 12 e das 14 às 17h, contando com um funcionário responsável pela orientação do público. Em nosso acervo, existem livros infantis, pedagógicos e técnicos, material para formação de professores e voltados para as artes e religiões de matriz africana. São realizadas ainda, diversas atividades. São elas: as mostras de Cinema Negro, que são abertas a todos os públicos e sempre seguidas de bate-papos. O Ajeun Cultural, um momento de confraternização onde são servidas iguarias da culinária afro e realizadas intervenções artísticas com poesia, leitura dramática, teatro e música. O Curso de Língua e Cultura Yorubá, onde são utilizadas canções, mitos e ditados tradicionais para o ensino desta língua africana, através de aulas práticas. Os Bate-Papos Pedagógicos, direcionados a educadores, discutindo o ensino de história e cultura afro-brasileira e africana nas escolas. O Projeto NaEncruza, que é um encontro com membros das religiões afro para discutir questões ligadas a esse grupo e o Projeto Omodé Griô que realiza contação de histórias e oficina de jogos africanos para crianças da comunidade.


Atualmente a Biblioteca Abdias do Nascimento está em fase de mudança para a sua nova sede localizada no bairro de Periperí, uma parceria formada com a Associação Recreativa Bonfim de Esporte, com inauguração prevista para o dia 16 de abril de 2011, visando ampliar suas atividades e facilitar o acesso dos usuários.